‘Não tem coisa mais triste’, diz mãe da 1ª vítima de feminicídio de MS após 10 anos

Isis Caroline foi morta 84 dias após a Lei de Feminicídio ser sancionada no Brasil

| MIDIAMAX/CAROL LEITE


Mãe da 1ª vítima de feminicídio no MS (Foto: Helder Carvalho, Jornal Midiamax)

O dia 1º de junho nunca mais foi o mesmo para Margareth Oliveira da Silva e as suas duas netas. Elas são mãe e filhas da Ísis Caroline da Silva, reconhecida oficialmente como a primeira vítima de feminicídio de Mato Grosso do Sul, após a promulgação da lei de mesmo nome.

Apesar de mulheres serem violentadas e mortas por seus companheiros há muito tempo, Ísis é considerada a primeira vítima devido a uma conjunção de datas. A Lei do Feminicídio, sancionada no dia 9 de março de 2015, inseriu no Código Penal o crime de homicídio contra mulheres no contexto de violência doméstica e de discriminação. Exatos 84 dias depois, Ísis foi morta pelo ex-marido, tornando-se a primeira vítima oficial do crime no Estado.

Após dez anos da morte de sua filha caçula, Margareth conversou com a reportagem do Jornal Midiamax e contou como tem vivido essa última década sem Ísis.

“Como que vou explicar… É uma saudade infinita, né? Uma dor grande no coração, uma lembrança que não tem fim', contou, com olhos marejados, enquanto relembrava os fatos. Segundo Margareth, na noite anterior à entrevista, começou a sentir dores musculares e quase desmarcou a conversa.

Mas o anseio por Justiça e não deixar que a história de Ísis caia no esquecimento fez com que ela enfrentasse a dor de relembrar o ado. “É uma saudade constante, saudade de uma pessoa que não vai voltar mais, que a gente ama infinitamente, principalmente eu, que sou mãe', explicou.

Na contramão da ‘lei natural da vida’, nenhuma mãe deveria ter que enterrar o próprio filho, mas com Ísis e Margareth não foi assim. A filha, com somente 22 anos, teve um fim trágico no dia 1º de junho de 2015, quando foi morta afogada às margens do Córrego Mutum, em Ribas do Rio Pardo, pelo ex-marido, Alex Arlindo Anacleto de Souza.

Histórico de violência doméstica

O relacionamento de Ísis com o autor do crime era conturbado. Em agosto de 2014, quando moravam em Três Lagoas–MS, ela foi sequestrada, estuprada e ainda teve os cabelos raspados pelo homem, que sempre a ameaçava caso tentasse ficar longe dele.

Na tentativa de colocar um fim no relacionamento abusivo que vivia, Ísis se mudou para Campo Grande com as filhas de 6 e 2 anos, e aram a viver na casa do pai de Ísis. Após três meses, a vítima começou um novo relacionamento e foi morar com o novo parceiro e as filhas.

“Eu ligava para ela todos os dias. No dia que ela desapareceu, liguei umas 10h30, perguntei se estava tudo bem, se ela precisava de alguma coisa. Quando foi umas 14h, senti um baque no meu coração. De repente, lágrimas caíram do meu rosto', relembrou Margareth sobre a última conversa com a filha.

Assim, no dia 1º de junho, Ísis saiu de casa para fazer compras e nunca mais voltou. Durante o percurso, ela encontrou com Alex, entrou no carro dele. No percurso, teriam iniciado discussão. O autor, mudou o destino, ando uma estrada no município de Ribas do Rio Pardo, local onde asfixiou a vítima. Em seguida, arrastou o corpo de Ísis até o córrego, na tentativa de esconder o crime cometido.

O corpo da vítima foi localizado no sábado, seis dias após o seu desaparecimento. “A gente sempre tem aquela esperança de que ia encontrar ela [viva], né? A minha irmã chegou e disse: ‘encontraram o corpo’. Eu não sei se tem coisa mais triste no mundo do que isso', contou Margareth.

Condenação

Alex Arlindo Anacleto de Souza foi preso na tarde do mesmo dia em que o corpo de Ísis foi localizado. O julgamento ocorreu em 2017, no qual foi condenado a 26 anos de prisão pela morte da ex-mulher.

No entanto, para Margareth, essa não foi uma pena justa. “Foi pouca pena, porque ninguém deveria ter o direito de acabar com a vida de alguém igual ele tirou da minha filha, né? [Pena de] 26 anos é pouco pelo o que ele fez', conta, com indignação.

10 anos sem Ísis

“Ela era minha nega maluca, ela chegava em casa e me chamava ‘e aí, mãe preta’, e eu dizia, vem cá minha nega maluca', conta, com generosidade, Margareth, enquanto reabre a ferida que não cicatrizou. Em sua casa, não há porta-retratos com fotos de Ísis, nem a comida favorita da filha ela consegue cozinhar.

“Na sexta-feira Santa, comprei duas latas de sardinha, mas até hoje não consegui fazer, porque macarrão com sardinha era a comida favorita dela', contou. As latas continuam no armário, escondidas, aguardando o dia que Margareth vai conseguir cozinhar a refeição favorita de sua filha.

As filhas de Ísis eram pequenas na época em que a mãe foi assassinada, mas guardam as poucas lembranças com carinho. “A mais nova tinha dois anos e meio, ela lembra que a mãe dela dava carne para ela comer, fazia batatinha frita, mas ela não teve aquele convívio, era um bebê ainda', conta a avó.

Já a filha mais velha, tinha seis anos na época do crime. “Ela lembra muito bem da mãe dela, só que ela procura não falar para eu não sofrer, porque eu sofro calada', explicou Margareth.

Mesmo com os olhos cheios d’água, quando questionada de como Ísis era, um sorriso apareceu no rosto de Margareth, que se enche de orgulho de falar da filha. “Tudo estava bom para ela, uma menina carinhosa, amiga, dedicada às filhas e à casa. E não é por ser minha filha, era pela convivência com ela mesmo', finaliza a mãe.

???? Onde buscar ajuda em MS

Em Campo Grande, a Casa da Mulher Brasileira está localizada na Rua Brasília, s/n, no Jardim Imá, 24 horas por dia, inclusive aos finais de semana.

Além da DEAM, funcionam na Casa da Mulher Brasileira a Defensoria Pública; o Ministério Público; a Vara Judicial de Medidas Protetivas; atendimento social e psicológico; alojamento; espaço de cuidado das crianças – brinquedoteca; Patrulha Maria da Penha; e Guarda Municipal. É possível ligar para 153.

☎️ Existem ainda dois números para contato: 180, que garante o anonimato de quem liga, e o 190. Importante lembrar que a Central de Atendimento à Mulher – 180 é um canal de atendimento telefônico, com foco no acolhimento, na orientação e no encaminhamento para os diversos serviços da rede de enfrentamento à violência contra as mulheres em todo o Brasil, mas não serve para emergências.

As ligações para o número 180 podem ser feitas por telefone móvel ou fixo, particular ou público. O serviço funciona 24 horas por dia, 7 dias por semana, inclusive durante os finais de semana e feriados, já que a violência contra a mulher é um problema sério no Brasil.

Já no Promuse, o número de telefone para ligações e mensagens via WhatsApp é o (67) 99180-0542.

???? Confira a localização das DAMs, no interior, clicando aqui. Elas estão localizadas nos municípios de Aquidauana, Bataguassu, Corumbá, Coxim, Dourados, Fátima do Sul, Jardim, Naviraí, Nova Andradina, Paranaíba, Ponta Porã e Três Lagoas.

⚠️ Quando a Polícia Civil atua com deszelo, má vontade ou comete erros, é possível denunciar diretamente na Corregedoria da Polícia Civil de MS pelo telefone: (67) 3314-1896 ou no GACEP (Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial), do MPMS, pelos telefones (67) 3316-2836, (67) 3316-2837 e (67) 9321-3931.

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